Assassinato da Juíza Patrícia Acioli: milícias são parte integrante do Estado.


Toda uma encenação segue sendo feita em torno do assassinato da Juíza Patrícia Acioli, responsável pela punição de mais de 60 policiais e ex-policiais membros de milícias, só da região de São Gonçalo, no Rio de Janeiro. A Juíza já estava jurada de morte pelas milícias, o que é conhecido publicamente. Depois de sua morte várias “nomeações” e  “comissões especiais” ainda serão constituídas para “apurar os fatos” e nada de significativo será feito para desarticular as milícias.

É evidente  o crescimento e a proporção da ação das milícias, que expõe a desenvoltura e a dimensão do crime organizado no Rio de janeiro. As milícias não chegam a ser um poder paralelo ao Estado justamente porque são parte do próprio Estado.

No quadro de crise econômica e institucional, a guerra entre grupos de poder se estende além da estrutura do aparelho estatal, tomando entre outras, a forma de milícias. Estas só são denunciadas quando  cometem um crime como o assassinato da juíza, que expõe a própria natureza desse Estado.

Agora é feita a comprovação de que os projéteis usados no crime foram vendidos para os batalhões da PM em São Gonçalo. Diante desse fato, o Comandante da PM do Rio de Janeiro, Cel. Mário Sérgio Duarte afirma peremptoriamente que “se não houve participação direta de PMs, houve pelo menos na preparação do crime”. O Cel. Mário Sérgio tenta parecer ofensivo ao afirmar  o que é de conhecimento geral. Fala como se estivesse surpreso, como se não conhecesse bem os criminosos que ajudou a formar.

As milícias já são parte integrante da escalada de agressão ao povo carioca. Constituídas de policiais e ex-policiais, elas seguem os procedimentos e a truculência aprendidos e praticados rotineiramente pela polícia, que conhece e sabe de tudo isso, mas que funciona, na verdade, como órgão regulador do crime, e não para impedi-lo.

O ataque ao tráfico no Rio significou apenas  uma mudança do controle, uma reorganização do crime e do comércio de drogas e armas, que passou para novas mãos. Assim, as milícias já mantém o controle do crime em vastas regiões na cidade e no estado do Rio. Ameaçam, perseguem e matam nas comunidades, onde mantém e controlam redes de TV a cabo, distribuição de gás e eletricidade, moto táxi, cobrança de taxas mensais para “segurança” dos moradores, etc. Tudo sob ameaças e controle armado, exatamente com os mesmos métodos do tráfico. As milícias lucram milhões e chegam a manter empresas de grande porte, como a recém denunciada  na exploração de vasta área mineral em Santa Cruz, Zona Oeste do Rio. Tudo isso não poderia ser administrado ou admitido oficialmente dentro do “Estado de Direito”.

Essas organizações armadas que funcionam sob a égide e com o aval do Estado contam com a cobertura aberta ou dissimulada dos seus membros e mesmo mandantes na assembleia legislativa, na câmara federal, no senado e nas câmaras municipais, particularmente da cidade do Rio. As últimas eleições confirmaram o número de seus representantes, “eleitos democraticamente”; além de muito bem estruturadas nos “poderes” Executivo e Judiciário. A realidade dessas ligações são de conhecimento geral e comprovadas seguidamente pelas notícias que escapam ao controle do monopólio de imprensa.

A fachada de legalidade e justiça desse velho e carcomido Estado não resiste aos atos de suas próprias quadrilhas. O assassinato da Juíza Patrícia Acioli foi mais uma comprovação dessa realidade.

E para que nada mude de fato, certamente, mais uma vez, alguns “peixes pequenos” serão “identificados”, acusados e condenados com toda a encenação que acompanha essas ocasiões, quando é necessário punir alguém, sem mexer nas estruturas principais.

Como parte disso, o monopólio de imprensa, cumprindo sua parte, se esforça em convencer o povo e a sociedade de que existem leis, de que o Estado “controla a situação”, que alguns setores da “justiça” estão “seriamente” empenhados  na solução do caso, etc. Essa é sua parte no jogo, procurar dirigir a discussão e conduzir a “opinião pública”. Como é o caso de colocar a questão da solicitação  ou não de proteção pela juíza; de quem é a responsabilidade por ela ter ou não ter tido proteção, ou investigar e emitir comentários sobre a conduta pessoal da juíza, etc.

Tudo isso faz parte dessa tentativa de desviar a atenção do que é o principal. Sobre o porque da força e da liberdade de ação das milícias, sobre o que elas significam. Sobre isso, nada, nem uma vírgula. E quando algo aparece já vem deformado e com as informações manipuladas.

É uma ilusão esperar punição dos verdadeiros mandantes. Afinal os membros desse Estado não pretendem atacar nem punir a si próprios. Depois de muita cena, pretendem que tudo volte a ser como antes, que tudo caia no esquecimento, a não ser, é claro, o recado dos 21 tiros. 
 
 
CEBRASPO – Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos

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