GAZA: PERGUNTAS E RESPOSTAS


Fotos de ato realizado no Rio de Janeiro, em 08.01.2009, contra o massacre de palestinos

Emir Sader
07/01/09

1) A questão de fundo dos conflitos na Palestina é o veto dos EUA e a oposição militar de Israel contra a resolução da ONU do direito de existência de um Estado de Israel e de um estado Palestino. O Estado israelense existe, porém os EUA – com seu veto no Conselho de Segurança – e Israel, com a ocupação dos territórios palestinos, impedem que a resolução da ONU seja posta em prática – única solução justa e com possibilidade de promover uma paz duradoura na região.

2) Nas eleições mais democráticas de toda a região - conforme atestado da própria Fundação Carter – o Hamas foi eleito. As potências ocidentais promoveram o boicote, junto com Israel, desconhecendo a vontade
expressa dos palestinos. Essa é a raiz mais imediata dos conflitos atuais.

3) Se o Hamas é considerado uma organização terrorista e nunca invadiu territórios israelenses, como deve ser considerado o Exército de ocupação israelense?

4) A teoria das "guerras humanitárias" da Otan, formulada por Tony Blair, promoveu o bombardeio e a intervenção na Iugoslávia, acusada de promover uma limpeza étnica. Não se aplica a mesmíssima teoria a Israel?

5) O que se deve fazer para que Israel pare a "carnificina" – a expressão é do Lula – em Gaza?

6) A ruptura da trégua não foi feita pelo Hamas, mas por Israel, que em novembro matou seis dirigentes da organização.

7) O presidente da União Européia, presidente da República Checa, disse que "a ação de Israel é defensiva" (sic). Argumento similar utiliza a corrente revisionista da história alemã, que alega que os campos de concentração do nazismo foram uma ação preventiva (sic) em relação à repressão
bolchevique na URSS.

8) A tese central do sionismo é a de que Israel é um povo escolhido, segundo sua interpretação dos textos religiosos. Ela vem de muito antes do nazismo. Daí que o holocausto sofrido na Alemanha não poderia ser
comparado com nada. Isto é, o sofrimento alheio, inclusive o perpetrado por eles, nunca é igual ao deles. Têm em comum com os EUA a tese de que seria um poço redestinado para resgatar a humanidade da barbárie,impondo-lhe seu sistema político, fundado supostamente na liberdade.

9) Israel justifica o bombardeio indiscriminado de todos os lugares de Gaza, porque em qualquer lugar, segundo eles, - nas mesquitas, nas escolas, nos hospitais etc. – poderiam estar escondidas bombas e militantes do Hamas. A Universidade atacada seria antro de professores e estudantes do Hamas. Atacam tudo com a mesma visão norte-americana no Vietnã: haveria que
tirar a água (o povo) do peixe (os militantes). Assim buscaram destruir o
Vietnã inteiro, com bombas napalm e bombas terrestres, que até hoje os
vietnamitas ainda estão retirando.

10) Corre por ai um argumento envergonhado de defender a carnificina israelense, perguntando o que faria o Brasil se um país fronteiriço – alguns se atrevem a mencionar o Uruguai – ameaçasse a existência do Brasil,sugerindo que deveríamos fazer com nosso vizinho do sul o que Israel faz
com os palestinos em Gaza: uma guerra de extermínio. Em primeiro lugar, o Brasil não ocupa nenhum outro país e se algum governo aventureiro tentasse fazê-lo, não teria nenhuma possibilidade de conseguir o consenso interno que Israel obtém para fazer a guerra contra os palestinos, há forças democráticas internas que impediriam. Foi preciso uma feroz ditadura militar para poder mandar tropas para a República Dominicana, junto com as dos EUA, para afogar um movimento democrático naquele país. Em segundo lugar, o Uruguai, país de muito longa tradição democrática, nunca significaria riscos de extinção para o Brasil, nem nenhum outro vizinho. É um sofisma esse argumento, da mesma forma que o do Obama visitando Israel na campanha eleitoral, quando disse que se ameaçassem suas filhas dormindo na sua casa, se permitiria qualquer ato de agressão para defendê-las. Seu silêncio atual demonstra como as filhas de israelenses são privilegiadas em relação às dos palestinos, que ocupam diariamente a imprensa, feridas, aterrorizadas ou nas morgues, esperando lugar para serem enterradas. Quem hoje não se indigna diante do massacre israelense
e se refugia no silêncio ou em sofismas, perdeu a humanidade há muito tempo.

11) Pode-se fazer tudo com os mísseis, menos sentar em cima deles (para adaptar a fórmula clássica à época dos mísseis, antes eram baionetas). Isto é, uma vitória militar pode ser perdida politicamente por Israel. No Vietnã também a proporção era de uma vítima norte-americana por 10 ou 100
vietnamitas (lá também se matava indiscriminadamente e se dizia que eram guerrilheiros; todo morto virava guerrilheiro). Em algum momento se terá que estabelecer um novo acordo político e que acordo Israel acredita possível com o ódio que gera a carnificina que está produzindo e com o repúdio da opinião pública internacional?

12) Nenhum povo do mundo que oprime um outro, poderá viver em paz. Israel nunca terá paz, antes dos palestinos terem o mesmo direito deles – possuir um Estado soberano.

13) Mais do que nunca os judeus de esquerda, progressistas ou simplesmente pacifistas, os que não estão de acordo com o massacre de Israel contra o povo de Gaza, têm que se manifestar, para que não se generalize a justa condenação de Israel e do sionismo, com a totalidade dos judeus.

14) Eu não tenho raízes islâmicas, apesar do meu nome. Sou filho de libaneses maronitas/católicos. Minha identificação com os palestinos hoje é a mesma que tive – como tantos – com os vietnamitas. Hoje, SOMOS TODOS PALESTINOS.

Comentários

Punk disse…
Boa análise!

Ter ou não raízes islâmicas, de nada importa para o caso... que na minha opinião é político e não religioso/étnico/cultural. É de facto uma consequência do imperialismo americano e da actuação dos seus fieis cães de fila, como os israelitas (e porque não os Sauditas?, provando em definitivo a irrelevância de supostas raízes islâmicas).

Naturalmente, como "bons imperadores" dominam os média, como muito bem descreve Chomsky, e baptizam de terroristas quem muito bem (não) lhes interessa. Como o legitimamente eleito Hamas, como o PKK, o ANC nas décadas de apartheid, as colombianas FARC, o EZLN, etc., etc.

E assim, com ou sem eixos do mal, antes ou após 11s de Setembro, com ou sem terras prometidas em bíblias, toras ou al-corões, se vai alimentando o negócio.

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